O Conto da Princesa Kaguya (2015), dirigido por Isao Takahata e produzido pelo Studio Ghibli, é uma verdadeira obra-prima do cinema de animação. Baseado no antigo conto popular japonês “O Conto do Cortador de Bambu”, a animação é uma narrativa poética, visualmente deslumbrante e emocionalmente profunda que encanta desde o primeiro momento. Diferente de outras produções do estúdio, O Conto da Princesa Kaguya opta por um estilo de arte minimalista, inspirado em aquarelas, que traz uma sensação de leveza e delicadeza incomuns, destacando a beleza da simplicidade.

A história começa quando um humilde cortador de bambu, chamado Sanuki no Miyatsuko, encontra um pequeno broto de bambu brilhante que, ao ser cortado, revela uma minúscula princesa. Encantado, ele a leva para casa, e junto com sua esposa, cuida da pequena criatura que rapidamente se transforma em uma linda bebê humana, crescendo com uma velocidade surpreendente. O casal acredita que ela é uma dádiva dos céus e decide criá-la como sua filha, chamando-a de “Princesa”.

À medida que Kaguya cresce, ela se adapta à vida simples e feliz nas montanhas, brincando com as crianças locais e explorando a natureza. Contudo, sua vida dá uma reviravolta quando Sanuki encontra ouro e tecidos finos dentro de brotos de bambu, interpretando esses achados como um sinal de que sua filha deve ser criada como uma verdadeira nobre. Ele decide levar a família para a capital, onde constrói uma mansão e começa a educar Kaguya nos modos da aristocracia, na tentativa de transformá-la em uma princesa digna dos padrões da época.

É a partir desse ponto que o filme mergulha em uma crítica sutil, porém poderosa, às expectativas da sociedade sobre o papel da mulher e as pressões que Kaguya enfrenta para se conformar a uma vida que não escolheu. Embora criada como uma princesa, com riquezas e pretendentes à sua disposição, Kaguya não encontra felicidade na opulência. Ela anseia pela liberdade e pela simplicidade de sua vida anterior nas montanhas. Seu dilema é profundamente comovente, pois retrata a eterna busca pela verdadeira identidade e felicidade em meio às exigências impostas pela sociedade.

Um dos grandes destaques de O Conto da Princesa Kaguya é o visual único e deslumbrante. Ao contrário das animações mais convencionais, o filme usa traços que lembram pinturas à mão, com linhas suaves e aquarelas que parecem capturar o espírito dos antigos contos folclóricos japoneses. Esse estilo artístico não só diferencia o filme esteticamente, mas também reflete a delicadeza e efemeridade da vida de Kaguya. As cenas de transição de paisagens, em especial, são de uma beleza de tirar o fôlego, onde cada movimento da natureza parece ter vida própria.

Takahata, com seu talento singular, explora temas universais de maneira sensível e poética. A questão da liberdade versus obrigação é central na narrativa. Kaguya é forçada a assumir um papel que não deseja, e o filme mostra o peso dessas expectativas com uma sensibilidade que ressoa profundamente com o público, independentemente de idade ou cultura. A Princesa, em muitos momentos, sente-se aprisionada em uma vida que lhe é imposta, o que reflete os sentimentos de muitos que enfrentam as pressões da sociedade e lutam para encontrar seu próprio caminho.

Outro aspecto emocionante da obra é a música composta por Joe Hisaishi, que, como sempre, adiciona uma camada extra de emoção ao filme. Suas composições delicadas e etéreas acompanham perfeitamente as cenas, amplificando os momentos de alegria, tristeza e contemplação. A trilha sonora é um elemento essencial para criar a atmosfera sonhadora e melancólica que permeia a história de Kaguya.

O Conto da Princesa Kaguya é uma escolha imperdível. Ele vai além do conto folclórico japonês, explorando questões de identidade, liberdade e os sacrifícios feitos em nome das expectativas sociais. Uma verdadeira joia do Studio Ghibli, que prova mais uma vez o poder da animação como forma de arte.