Entrevista Ivan Antônio – Projeto Teatro Solidão Solidária (TSS) e Projeto Quando o Dia Amanhecer

Ivan Antônio 
Ivan Antônio. Reprodução: Instagram

Entrevista Ivan Antônio  – Projeto Teatro Solidão Solidária (TSS) e Projeto Quando o Dia Amanhecer

Em um mundo onde a arte muitas vezes é vista apenas como entretenimento, há indivíduos que acreditam em seu poder transformador e seu potencial para gerar impacto positivo na sociedade. Ivan Antônio é um desses visionários, cujo compromisso com a comunidade e paixão pela arte se fundem nos projetos Teatro Solidão Solidária (TSS) e Quando o Dia Amanhecer.

O Teatro Solidão Solidária (TSS) não é apenas uma forma de expressão artística, mas também uma ferramenta para promover a inclusão social e a conscientização sobre questões importantes. Sob a liderança de Ivan Antônio, o TSS tem se destacado como um espaço onde indivíduos de diferentes origens encontram voz e pertencimento, utilizando o teatro como uma plataforma para abordar temas relevantes e inspirar mudanças significativas. Além disso, o projeto Quando o Dia Amanhecer surge como uma extensão desse compromisso, buscando iluminar os cantos mais sombrios da sociedade através da arte e da cultura. Como fundador e idealizador dessas iniciativas, Ivan Antônio tem trabalhado incansavelmente para construir pontes entre as comunidades e catalisar uma onda de positividade e esperança.

Nesta entrevista exclusiva, mergulhamos no mundo fascinante desses projetos inovadores, explorando não apenas seu impacto tangível, mas também a filosofia e a paixão que os impulsionam. Nossos agradecimentos a Ivan Antônio por nos ceder essa entrevista, onde explora o poder da arte como um catalisador para a mudança social.

Teatro Solidão Solidária (TSS) Método de mediação, resolução de conflitos e inclusão social através da arte.

Nii-Sans Produções: O que é e como surgiu a ideia de criar o Teatro Solidão Solidária (TSS)?

O Teatro da Solidão Solidária é um método criado em vinte anos de pesquisa sobre a solidão humana.  Tendo a solidão como o meu objeto de pesquisa, fiz uma imersão durante duas décadas nas grandes metrópoles brasileiras e cidades da Europa, Estados Unidos e América Latina. Me passando por um homem em situação de rua e permanecendo de cinco a dez dias por ano entre eles, eu pude vivenciar as dores, as alegrias, fome, medo, a violência e a solidão dessas pessoas, denominadas como invisíveis e tão excluídas da sociedade.

Em 1993, na cidade de São Paulo, a partir da construção de um personagem que eu interpretava no espetáculo “O sanatório para Freud”. O personagem era um homem em situação de rua que sofria de transtornos mentais. Busquei nas praças e embaixo dos viadutos da capital paulista, homens, mulheres e crianças que pudessem me ajudar a compor o personagem e lá encontrei grandes mestres e mestras que contribuíram enormemente para direcionar a minha arte para outro campo de atuação. Desde então, me dediquei a pesquisar sobre a solidão humana e como criar mecanismos para que o meu método teatral pudesse ser uma ponte que intermediasse uma discussão e a prática da solidariedade entre pessoas que, independente das suas crenças religiosas, políticas, partidárias e dos seus meios sociais; também para desenvolverem uma vocação para a partilha do amor, da compaixão e da tolerância, sobretudo da solidariedade humana.

Nii-Sans Produções:  Pode nos contar um pouco sobre o objetivo principal por trás desse projeto?

Desde sua criação, a metodologia   do Teatro da Solidão Solidária visa desenvolver e potencializar, uma forma que auxilie a compreensão do Eu/Ator/Artista, como não apenas como um passageiro por esse planeta, mas compreendendo que sua breve jornada nessa existência possa e deva se tornar a sua própria cura! Então, o ator/artista, tomando posse desse entendimento, não apenas se posiciona, mas interfere de uma maneira direta e indireta na missão de curar o mundo a partir da sua rua, seu bairro, cidade e país.

Nii-Sans Produções:  Como o TSS se expandiu para o Brasil, Estados Unidos, França e Portugal? Quais foram os desafios enfrentados nesse processo?

Através das minhas imersões pelo Brasil e em outros países. No Brasil, em especial na cidade de São Paulo — onde nasceu o método — a cada imersão não apenas com pessoas em situação de rua, mas também com adolescentes internos na antiga FEBEM (Fundação Estadual para o Bem-estar do menor de São Paulo) e com egressos do sistema prisional, a cada imersão e vivência nesses ambientes, tanto eu, como os atores e colaboradores do TSS promovíamos uma devoluta a sociedade por meio de oficinas e palestras em escolas, universidades, associações de moradores, SESCs e outras instituições, sobre nossa experiência e aprendizado. Essas ações nos possibilitaram uma divulgação do método no Brasil, e quando fui aos Estados Unidos e a Europa pesquisar sobre a solidão de imigrantes e refugiados e ministrar oficinas para os mesmos, o método já tinha uma visibilidade capaz de promover o interesse de universidades estrangeiras, festivais internacionais de arte, cultura e direitos humanos, que potencializou a expansão do nosso trabalho nesses países. Atualmente divido a minha agenda entre o Brasil, Estados Unidos e Europa, ministrando palestras, oficinas, lançando livros, fazendo shows e criando núcleos do TSS.

Inicialmente, o meu próprio medo e insegurança foram desafios que tive que enfrentar, cheguei a São Paulo na década de noventa, era um retirante pernambucano em terras estranhas, um homem e um artista preto, um diretor desconhecido numa cidade dominada por uma tendência não apenas mercadológica, mas ideológica da cultura branca. A pesquisa para a criação do método, durante muitos anos, se manteve em absoluto silêncio, havia um medo em mim de me manifestar como pesquisador, inclusive com meus próprios alunos e elencos das várias peças que dirigi. Além do peso da descriminação por ser um artista preto, nordestino, retirante, ainda havia o desinteresse das grandes empresas em associar seu nome ou as suas marcas a uma instituição que desenvolvia um trabalho diretamente ligado a pessoas em situação de rua, ex presidiários e jovens em situação de vulnerabilidade social. Também mais que um patrocínio, faltava um maior entendimento de que uma sociedade de braços dados com a arte pode mudar a cultura da intolerância, do preconceito e do desamor, que retardaram o aparecimento do método como uma pesquisa.

Nii-Sans Produções:  Qual a importância de ter núcleos em cidades como São Paulo, Fortaleza, Guarulhos, Camaçari e Salvador para o desenvolvimento do TSS?

São cidades que abrigam pessoas em situação de rua oriundas de várias partes do Brasil e do mundo, e que muitas vezes os acolhem como sub humanos e também por serem grandes metrópoles com grande potencial artístico, cultural e em especial pelo imenso número de artistas em estado de solidão profunda, oriunda da jornada de partilha, mas da que vivem sob a cotidiana negação de direitos. Artistas dedicam a sua vida a acolher, mas também precisam ser acolhidos, fazem plateias inteiras rirem, mas que podem voltar chorando para casa, muitas vezes por falta de dinheiro até para o transporte para voltar. Artistas incompreendidos pelo seu modo de vida e pela falta de oportunidades de trabalho.

Nii-Sans Produções:  Nessas grandes metrópoles a solidão  é uma palavra fora do contexto da possibilidade plena de mudar-se. Como o TSS contribui para a promoção da solidariedade e inclusão social por meio do teatro?

O Teatro da Solidão Solidária trabalha o homem, a mulher, a criança como um ser pleno de força e possibilidades. Ao reunir pessoas de segmentos sociais distintos num mesmo espaço, criamos a possibilidade do diálogo e da partilha de saberes onde um pode auxiliar o outro. Os exercícios tanto de voz como de corpo vivenciados durante as oficinas proporcionam uma reflexão sobre o nosso existir no mundo e como podemos melhorar como seres humanos. Quanto ao artista de teatro ou de outro segmento da arte, ao experimentar os exercícios do método do TSS, percebe-se por dentro, se esvaziando do mero discurso performático, ele aprende de outra maneira os elementos que compõem o fazer teatral e o edifício onde se pratica o fazer teatral. Ele não só entende o palco como algo sagrado, mas, por exemplo, que o proscênio não é apenas a parte que antecede o palco, ou que a cortina é um muro que divide os dois ambientes, ele entende sendo levado a pensar nesses dois ambientes como subconsciente e consciente, perguntando-se em quais dos dois se acomodam a mágoa, o rancor, a dor da solidão e qual o caminho a se seguir depois que se percebe isso.

O artista aprende a entender a iluminação não apenas como cores que conduzem o espectador a sentir o ambiente em mudança, mas que essa mudança não começa no ator no que ele enxerga por fora, mas dentro. Tudo tem outra ressignificação no Teatro da Solidão Solidária, o gesto, a voz, o movimento e o silêncio, que pode ser o maior grito não para a plateia, mas para o próprio artista em estado de silenciamento.

O ser humano, o artista, tocado pelo TSS, se redescobre, se cura e ajuda a curar o outro, sobretudo de uma solidão infinita, quando não conseguimos nos enxergar como plenos.

Nii-Sans Produções:  Existem histórias ou experiências específicas que destacam o impacto positivo do TSS na vida das pessoas?

O TSS contribui com a mudança de paradigmas, acolhendo pessoas de todas as classes sociais através dos seus cursos, palestras e espetáculos, possibilitando a convivência harmoniosa entre pessoas que antes eram tão distantes e de classes sociais tão diferentes. Juntando no mesmo palco ou escola, essas pessoas, com a convivência, vão percebendo o real valor do outro e o quanto são parecidos apesar de diferentes, e quando isso é percebido, uma grande revolução acontece. Independente de sua classe social ser diferente, pode-se auxiliar os outros.

 

Teatro da Solidão Solidária no Mundo

Nii-Sans Produções:  Como as diferentes culturas desses países influenciam a abordagem do TSS em cada localidade? Existe alguma adaptação específica do TSS para atender às necessidades culturais de cada região?

Sim, embora tenhamos consciência que a solidão é o mal do século e em todos os cantos do mundo existem pessoas em estado de solidão extrema, inclusive crianças cometendo suicídios, o TSS adapta às suas oficinas nos casos em que um país, por exemplo, não se permite o exercício HÁ BRAÇOS que sintetiza um abraço fraternal, às vezes um olhar de compaixão durante o exercício e outro sutil gesto de ternura torna-se um abraço mais poderoso do que a própria performance física. Não apenas adaptamos os exercícios devido à cultura do país que nos acolhe, mas também por trabalharmos por pessoas com necessidades especiais, pessoas com espectro autista e outras formas de estar no mundo. É importante salientar que todas e quaisquer mudanças que temos que fazer não nos impulsiona a mudar a rota da solidariedade, direitos humanos, amor e tolerância. A adaptação serve para as pessoas poderem compreender o método e para chegarmos até elas sendo respeitosos e tolerantes.

Projeto “Quando o Dia Amanhecer”

Nii-Sans Produções: O que é e o que motivou a criação do projeto “Quando o Dia Amanhecer”? Qual é a mensagem central que o projeto busca transmitir?

“QUANDO O DIA AMANHECER” é um projeto que resultará num grande espetáculo teatral, musical e de dança, que nasceu de um desejo antigo de todos nós do TSS e em especial a coordenação nacional, de inserir o núcleo do Teatro da Solidão Solidária de Goiás coordenado pelo nosso querido Rômulo Vaz no circuito nacional e internacional do TSS. A cidade de Goiânia, seu povo e seus artistas tem sido um grande e valioso farol para todos nós, o brilhantismo do filósofo e ator Rômulo Vaz e a toda a sua equipe, aliado a sua bravura e o seu empenho em criar ações de solidariedade como coordenador estadual, tem nos motivado a desenvolver cada vez mais ações artísticas, culturais e sociais na cidade, no sentido de potencializar o que já está acontecendo: Goiânia torna-se um dos principais núcleos do TSS no Brasil!

A mensagem principal do espetáculo é a esperança e a certeza de dias melhores. O espetáculo envolverá o público não apenas no assistir teatro, mas especialmente em sua própria ressurreição, em seu movimento interior, necessário para cada um de nós. Desejo que cada espectador possa se metamorfosear em potenciais transformadores da sua realidade e da realidade do outro.

Nii-Sans Produções:  Quais são os planos futuros para o Teatro Solidão Solidária e o projeto “Quando o Dia Amanhecer”? Há planos de expansão para outros países ou regiões?

Esperamos que o espetáculo seja um sucesso não apenas de público, mas de mudança de paradigmas, que possa colaborar com a cidade, seu povo e seus artistas, seja no crescimento do número de pessoas se engajando em ações e movimentos de solidariedade do TSS, ou também de outras instituições da cidade de Goiânia que tão bem conduzem trabalhos fantásticos em prol dos menos favorecidos, além de corroborar para que o teatro goianiense se expanda mundo à fora e receba o merecido reconhecimento.

Também há planos de expandirmos o Teatro da Solidão Solidária no continente africano, um continente irmão que muito tem a nos ensinar. Possivelmente o continente que talvez seja o que mais possa fazer isso… Nos ensinar.

Nii-Sans Produções: Ivan Antônio, qual mensagem você gostaria de transmitir para aqueles que desejam se envolver ou apoiar o TSS e o projeto “Quando o Dia Amanhecer”? Além disso, quais são as principais inspirações que guiaram o desenvolvimento desses projetos?

Inicialmente, uma mensagem de gratidão a todos os que direta ou indiretamente contribuíram e contribuem para a existência e difusão do TSS no Brasil e no mundo. A todos os que desejam participar da nossa família do Teatro da Solidão Solidária espalhada pelo mundo, precisamos de vocês, independente do que possam contribuir, seja uma voz amiga, um tempo como voluntário, a disponibilidade para ministrar oficinas ou palestras, pessoas que possam escrever projetos, captadores de recursos e patrocinadores. Sejam um de nós!

 

Conclusão de nossa entrevista com Ivan Antônio

Nii-Sans Produções: Como as pessoas interessadas podem obter mais informações ou se envolver com o Teatro Solidão Solidária e o projeto “Quando o Dia Amanhecer”?

Serão todos bem vindos e tenham certeza de que estamos todos humildemente de braços abertos para novos aprendizados. Mesmo com os nossos trinta anos de existência, que possamos somar com a experiência de vida, profissional, espiritual ou artística de cada um. Sejamos uma família aprendendo a conviver em harmonia e com isso ternurizar todos ao nosso redor.

Para participar do Núcleo do Teatro da Solidão Solidária em Goiás, podem procurar a nossa coordenação guiada pelo nosso querido Rômulo Vaz.

Para participar em outros estados e países, deve-se entrar em contato com a coordenação nacional pelo telefone: (71) 99314-9701, ou através dos nossos contatos pelas redes sociais.

Instagram, YouTube e Facebook: @TeatroDaSolidaoSolidaria

 

 

Mais uma vez, a Nii-Sans agradece ao Ivan Antônio por nos ceder esta entrevista. Muito obrigada a quem acompanhou também!

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Austra Caroline

Come to the Dark Side. We have coffee with cookies! ☕ Sou Arqueóloga e estudante de História, com atuação como Educadora Patrimonial, onde busco preservar e compartilhar o valor do nosso patrimônio cultural. Além disso, sou redatora em sites voltados para conteúdo nerd, Geek e cultura pop, sempre explorando o universo da cultura geek com entusiasmo. Sou apaixonada por jogos de Hack & Slash, com destaque especial para a série Devil May Cry, que alimenta minha paixão pelo gênero. Nas horas vagas, também me dedico à escrita, onde expresso minha criatividade e amor pela narrativa.

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